A recente medida provisória do governo federal, que visa eliminar a desoneração da folha de pagamento, representa um novo episódio nas divergências com o Legislativo sobre essa questão.

No ano anterior, o Congresso Nacional decidiu estender esse benefício para 17 setores da economia até o final de 2027, uma decisão posteriormente vetada pelo Poder Executivo.

Após a rejeição desse veto pelos parlamentares, parecia que o assunto estava resolvido. No entanto, Fernando Haddad, ministro da Fazenda, anunciou um plano de reoneração gradual desses setores, contrariando assim a determinação dos deputados e senadores.

Arnaldo Jardim, deputado federal pelo Cidadania-SP, criticou a abordagem do governo por escolher a medida provisória ao invés de um projeto de lei para lidar com a desoneração, dado que a medida provisória possui efeito legal imediato.

“Nós adotamos iniciativas para manter aquela desoneração dos 17 setores. Houve um veto — e nós derrubamos o veto. Agora, com essa medida provisória, o governo tenta driblar essa decisão do parlamento. O governo não pode simplesmente ir para o embate e estabelecer uma nova oneração sem diálogo”, critica. 

Entenda a evolução do caso

Em vigor desde janeiro de 2012, a desoneração da folha de pagamento tem como objetivo reduzir a carga tributária sobre as empresas dos setores beneficiados, incentivando a geração de empregos.

O mecanismo permite que as empresas optem pela contribuição patronal de 20% sobre a folha de salários ou o pagamento de uma alíquota de 1% a 4,5% sobre o faturamento — receita bruta — do negócio. 

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“No começo do ano, a empresa fazia as contas: ‘Quantos empregados eu tenho e quanto isso implicaria em folha? Quanto eu tenho de faturamento e o quanto isso significaria em tributação?’. E se submetia ou não à desoneração da folha. Normalmente, os setores que têm bastante volume de folha acabavam optando por pagarem sobre o faturamento”, explica Eduardo Natal, presidente do Comitê de Transação Tributária da Associação Brasileira da Advocacia Tributária (Abat).

Ao longo dos últimos 12 anos, o benefício foi prorrogado algumas vezes. A última delas no fim do ano passado, quando o Congresso Nacional estendeu a desoneração por mais quatro anos. Em 29 de dezembro, já durante o recesso parlamentar, Haddad anunciou uma medida que onera gradualmente os setores beneficiados pelo mecanismo. 

A MP 1202/23 acaba com a opção de as empresas recolherem os impostos tendo como base o faturamento. O texto divide as empresas beneficiadas pela desoneração atual em dois grupos de acordo com o código de Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), relativo à atividade principal de cada negócio.

Para as empresas que ficaram no primeiro grupo, a medida estabelece a volta progressiva da contribuição patronal entre 2024 e 2027 da seguinte forma:  

2024 – 10%; 
2025 – 12,5%; 
2026 – 15%; 
2027 – 17,5%. 

Já para as que foram classificadas no segundo grupo, estabelece o seguinte calendário: 

2024 – 15%; 
2025 – 17,25%; 
2026 – 17,5%; 
2027 – 18,75%. 

Segundo informações do governo, a aplicação de alíquotas reduzidas de contribuição patronal se limita ao valor equivalente a um salário mínimo por trabalhador.

Por exemplo, se um empregado recebe dois salários mínimos, a taxa reduzida de 10% ou 15% em 2024 (dependendo da categoria da empresa) incidirá apenas sobre o primeiro salário mínimo. Para o segundo salário mínimo, a taxa aplicada será de 20%.

A partir de 2028, todas as atividades econômicas estarão sujeitas à alíquota padrão de 20% da contribuição patronal, inclusive sobre o primeiro salário mínimo dos trabalhadores.

Há um entendimento entre oito dos 17 setores atualmente beneficiados com a desoneração que a medida provisória não permite a continuação da alíquota máxima reduzida. Assim, eles preveem que, a partir de 1º de abril deste ano — data em que a medida passa a vigorar —, deverão arcar com a taxa de 20%.

Para Eduardo Natal, a decisão do Executivo gera insegurança para o setor produtivo. “É uma mudança de critério no último minuto do ano passado que certamente vai afetar o setor, que já tinha precificado, feito o orçamento para 2024, considerando a aprovação da prorrogação do regime da desoneração”, avalia. 

De acordo com o especialista, a edição de uma medida provisória contrariando decisão do Congresso Nacional se deve a uma busca do Executivo por aumento da arrecadação, de modo que a meta fiscal de déficit zero este ano seja alcançada e o governo tenha recursos para gastar no ano que vem. 

“Vamos ficar nessa situação do governo querendo mais receita por causa das metas do arcabouço fiscal; e o setor privado tentando se virar do seu lado, com seu plano de negócio que já estava vinculado a essa desoneração que passou no final do ano passado” — ressalta. 

Nos cálculos da Fazenda, a estimativa é de arrecadar R$ 6 bilhões com a reoneração da folha de pagamento. 

Fonte: Brasil 61.

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